Olá... aqui estou eu a fazer mais uma vez o que meu coração pede: escrever cartas para que tudo saia do meu pensamento com a certeza que está tudo muito bem armazenado, porém hoje estou com um pequeno problema.... após uma ligação eu me senti triste, e, não sei se esta carta será o suficiente para me deixar bem, mas mesmo assim, por amor, a farei!
Esta devia ser a carta perfeita, queria escrever somente para os teus olhos, mas comecei mal pois a cor do papel não esta certa, não acertei no amarelo pardo com linhas escurecidas pelo tempo. O perfume borrifado não passou os sentimentos descritos, as colagens inusitadas ficaram na gaveta do meu quarto, não foi escrita com nanquim ou giz de cera... Escrevo-a com letra preta num fundo branco como uma receita médica com caracteres rascunhados pela pressão de sentir a perfeição dos sentimentos.
Temo não conseguir torná-la embaraçosa de tão ridícula, colante de tão exagerada, dramática de tão umedecida. A minha carta de amor não será ridícula por isso e talvez não recebas uma carta de amor como eu queria que fosse... O ridículo apenas é perfeito porque nos expõem totalmente.... e eu não sei se vou conseguir despir-me dos meus preconceitos e dúvidas.
Tenho sérias dúvidas se devo alimentar as analogias fáceis: O Amor comparado a natureza, a
Beleza interpretada por músicas do Sinatra... não quero transcrever letras de músicas ou poemas pois o plágio não costuma ser muito romântico... Embora possa ser ridículo... Fico na dúvida.
Tento incorporar o ridículo de uma outra forma. (Levantei-me e fui acender uma vela. Escolhi a de cor vermelha, coloquei uma música romântica e tomei um banho perfumado. Escolhi a minha melhor caneta, sentei-me com calma e olhei novamente para o papel. Vislumbro com dificuldade e a luz da vela não ajuda, mas tento concentra-me, e focar-me em ti. Imagino-te a ler cada linha dessa carta e fico com medo, por isso talvez te envie apenas o rascunho pois é mais espontâneo e desprovido de críticas.... [A minha própria auto-censura]). Ou talvez nem receba-a!
Nas poucas linhas já escritas, não encontro nada de criativo ou original. A necessidade de ser romântico engole o decorrer da escrita e a necessidade de provar o que digo magoa-me os dedos. O desespero de fazer com que a relação evolua faz-me esquecer as regras básicas da gramática e é complicado ser original ao falar de amor pois possuo a necessidade incessante de possuir um amor único, tão intenso como ninguém jamais viu, tão eterno o quanto dure, e apesar disso, tenho dificuldade em universalizar sem amolecer, sem fazer com que a magia se perca nestas palavras... mas tento. ...Sim, vou tentar nestas linhas.
Sim, vou tentar escrever esta carta de forma perfeita, apesar de ser estranho, estranho por ser exatamente eu a estar a escrever esta carta. Como posso ser eu? Eu, demasiado frio, independente, de bem com a vida? Corajosamente não mudei de personalidade pelos sentimentos que me invadem, embora muita coisa esteja diferente. A minha perspectiva alterou-se, os meus sonhos transformaram-se, os meus desejos tornaram-se mais reais, a minha solidão apareceu, as músicas agem com mais sentido e os poemas conseguem-se viver.
Parece que o mundo à minha volta adquiriu tons quase dramáticos, tão intenso, como o desejo de te possuir em mim novamente, em andar ao seu lado, de mãos dadas, conversar com você, ainda que em silêncio, dizendo te pelos olhos, tudo aquilo que não consigo definir nestas palavras. Por vezes, admito não ter esperanças que tudo é muito complicado, difícil, mas minto pois algo tem de existir ou não estaria escrevendo estas linhas.... Na verdade, esta carta é antes de tudo um desabafo, talvez por que temos esta necessidade de declarar e espalhar que estamos apaixonados mesmo depois do término.... Seria mais fácil escrever uma tese de doutoramento sobre “A importância de cada osso e músculo em nosso corpo”! É sempre mais fácil analisar e dissecar os sentimentos alheios por que não guardar estes sentimentos? Por que não proteger esta afecção dos danos da realização? Porque razão tenho de te entregar este tipo de poder sobre a minha emoção? Não sei e nunca saberei pois sou um ser humano comum.
Interrogo-me sobre esta necessidade de metamorfosear tudo em verbo e substantivo todo o objeto do meu desejo, dos meus sentidos, da minha ira, do meu cuidado, do meu ciúme, da minha admiração, do meu carinho demonstrado... Causa da angústia e do riso.... Porque o que causas em mim, nunca é indiferença e todos os teus gestos têm uma repercussão na minha existência... Pequena ou grande, boa ou má, Não importa, eu sei que existe. Na verdade, nunca gostei de sentir tão vulnerável a coisas tão banais mas a felicidade de atos simples, traz em si mesma, uma alegria tão plena, que praticamente me esqueço da vulnerabilidade da minha ingenuidade.
Alimentas-me as ilusões, enches-me de magia os meus pensamentos e vais conquistando como sempre e fazendo um cerco invisível e eu, praticamente rendido ainda me pergunto como tu não me leste os meus olhos. Sinto-os como se fossem letreiros em néon divulgando, ferozmente o que esta acontecendo em meu coração. Talvez a minha máscara esteja melhor aplicada que eu cogitava. Eu ainda desejo-te... comigo. Na verdade, quero ter comigo a certeza de que ao menos tentei pois talvez seja essa a função da necessidade absoluta do amor em declarar-se. “Por que amor, não se troca não se conjuga, nem se ama.” – declarava o Drummond, por isso esta carta nunca será perfeita, como eu não o sou, mas existe algo que te posso dizer e talvez assim a torne perfeita. “O Meu coração, com todas as taquicardias e arritmias do amor, sempre foi, é e sempre será teu.”
:(